Pastel de vento

Ele não gostava de pastel. Não que já tivesse provado muitos, talvez um ou dois em quinze anos, mas achava que eram gordurosos, insípidos, sem graça. Ela, ao contrário, adorava comer um bom pastel recheado com tudo a que tinha direito – azeitona, ovo picado, carne moída, crocante nas bordas, formato de meia lua (encontrava até crateras lunares na superfície da crosta). E seu sonho era levá-lo até uma pastelaria para juntos saborearem um daqueles “de comer à beira da estrada”.

Um dia, a surpresa: “Vamos parar aqui para jantar?” “Mas você não gosta disso!” “Sim, mas hoje quero experimentar de novo.” Noite de verão, calor na rua, pouca gente na cidade, ar condicionado ligado. Pediu uma cerveja e sugeriu que ela escolhesse a opção no cardápio, pois havia mil possibilidades – tamanho, formato, preço, salgado e até doce! E os nomes de cada item… poéticos, engraçados, óbvios, criativos, românticos, esportivos, enfim, tudo que a imaginação pode desencadear em um estômago gourmet.

Começaram pelo mais comum, o “Rodoviária”. Ela concedeu a ele a possibilidade de escolher o recheio e pediram “margherita”. Certo, não tem problema; como dizem os gaúchos, vamos comer o pastel pelas bordas… Dividiram o retângulo (não era uma meia lua!) em dois e desfrutaram daquele momento inédito. Não era gorduroso por fora nem tinha gosto de azeite por dentro. Pediram outro, sabor “portuguesa”. Tudo bem, vamos lá! Recheado com cebola, ovo, azeitona, óleo de oliva, tudo perfeito! Pizza tradicional sempre o foi o ponto fraco dele.

Para arrematar o encontro, ela pediu um pastel de maçã com canela. Suculento, aroma marcante, perfeito para comer junto com um café da tarde, combinação surpreendente com a cerveja gelada.

Conversaram o tempo todo: comentaram os clipes musicais na TV de tela plana, tentaram adivinhar os ingredientes apenas pelo nome do pastel, questionaram o serviço de tele-entrega com tantos motoboys na calçada conversando, observaram a atendente ao telefone anotando pedidos de longe sem dar atenção aos clientes sentados à sua frente, viram um grupo de três fregueses na mesma mesa mas cada um no seu celular, um casal em outra mesa compartilhando mensagens e olhares, comentaram como era a vida há quinze anos e hoje em dia…

“E o pastel de vento? Vamos voltar para experimentar!” “O quê? Existe mesmo?”

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