Grafite não pode para não sujar, cantar perturba os demais no show, assobiar irrita outros passageiros, conversar com o cobrador distrai o motorista.
Não quero sair de máscara, cansei de usar álcool gel, meu pet não precisa de coleira na rua, a calçada é perfeita para estacionar a moto da tele-entrega.
Cadeirante tem que ficar em casa, ciclista precisa escapar dos pedestres na ciclovia, idoso só sai de ambulância. Família com nenê, melhor levar no colo.
Comentar o livro na biblioteca custa o sossego da bibliotecária, orar em voz alta interrompe a prece do fiel, procurar um CD player é motivo de riso na concessionária.
Escrever a lápis é coisa antiga, enviar carta pelo correio faz o destinatário esperar para sempre, respeitar a sinalização de trânsito é ser boboca.
Parada de ônibus serve para correr e subir no coletivo, corredor de edifício cheio de gente é para parar no meio para conferir o celular, descartar o lixo limpo descarrega a culpa do consumidor ensandecido.
Por que caminhar na calçada se o risco é torcer o pé? Qual a razão para esperar o sinal verde para pedestres se preciso atravessar em apenas dez segundos?
A mobilidade na capital nos leva a ficar parados, esperando alguém liberar a passagem sem pressa. Placa de sentido proibido? Que tentação!
Então, como viver sem transgredir, se o fluxo da vida nose leva a criar atalhos não para chegar antes, mas simplesmente chegar?
Sou contra tudo isso.