Foi-se o tempo em que alguém ingressava em uma empresa e lá ficava até quando quisesse – ou precisasse.
Naquela época, a pessoa começava em um banco como estafeta e ascendia a gerente – ao meu olhar infantil, passar o dia sentado, fumando e tomando cafezinho com os clientes era muito fácil.
Uma jovem era contratada como vendedora em uma loja de departamentos e se aposentava como administradora da matriz. Para mim, nunca estava desarrumada, mesmo quando cuidava do jardim ou levava os filhos à igreja.
As professoras podiam chegar a diretora da escola no fim da carreira, quando então podiam descansar da balbúrdia dos estudantes gritões e rebeldes. Eu achava o máximo ter uma sala só para si e poder telefonar quando quisesse.
Isso não é mais comum. A maioria das pessoas migra entre diferentes profissões, ocupações e interesses ou até perde o emprego durante esse período. Isso causava estranheza para meu pai quando conversava sobre a trajetória profissional das novas gerações.
Oriundo de família pobre do interior, começou a trabalhar informalmente aos treze anos e pulou de emprego em emprego na cidade onde se instalou. Ascensorista, foi demitido porque levou o chefe, acompanhado da amante, até o andar do seu escritório. Eu o imaginava como vendedor de rua, levando no bolso um maço de dinheiro para troco (para mim, era rico e o fazia por vontade própria). Ao ser balconista de ferragem, desenvolveu o gosto por fios e parafusos.
No Exército, aprendeu a ser motorista de caminhão e auxiliar de enfermagem, o que foi muito útil na vizinhança onde morou depois de casado, pois era requisitado para aplicar injeção em crianças com dor de garganta e medir a pressão da velhinha da esquina.
Quando concluiu o serviço militar obrigatório, veio para a capital e ingressou na Varig como mecânico de aviões. Usou todo o conhecimento prévio para revisar motores, identificar fissuras e consertar circuitos queimados. Nunca concluiu o ensino médio, mas fez inúmeros cursos técnicos, aprendeu inglês instrumental e visitou fábricas de motores no exterior.
Vestiu o macacão de sarja azul com a sigla da empresa bordada nas costas das sete às cinco de segunda a sexta durante quarenta anos. Até hoje, quando estou em algum aeroporto, lembro do cheiro de querosene impregnado no uniforme quando chegava em casa pronto para jantar. Na segunda feira, lavado por minha mãe e seco ao sol, mantinha o odor da labuta semanal.
Os sapatos eram surrados, mas protegiam os pés que nos traziam o sustento e seguiam a tradição do “devagar se vai ao longe”, um ditado típico na família. Sem grandes ambições, crescemos sob as asas da Varig, que muita viagem nos proporcionou.
Recentemente completei trinta anos no Hospital Conceição. Atuei em vários serviços antes de aqui chegar. Segui um pedaço da trilha do meu pai.
Porto Alegre 16 de outubro de 2023.