Cá estou, saudando os visitantes e de costas para a cidade que, dizem, me idolatra. Eu que sempre andei a cavalo pelos pagos, há tempos sirvo de farol para pilotos e motoristas.
Lacei gado com minhas boleadeiras, salvei terneiro guaxo da fome, tosquiei muito borrego, campeei o rebanho antes dos relâmpagos. Esmaguei muita cruzeira com minhas botas.
Carreteiro de charque cozido na panela de ferro, trazida das bandas orientais em alguma peleia, vaca carneada no dia para o churrasco com os tropeiros.
O mate, velho abrigo para um coração cansado, me aquecia na geada, esperando a vaca parir.
Saía em cavalgada pelos campos congelantes e buscava sombra sob alguma figueira sobrevivente ao sol implacável dos pampas. Perdi meu guaipeca bem velhinho, montei minha égua tordilha até que morresse, pesquei lambari no açude sem cansar.
Meu pala de lã crua servia como pelego e aconchego (lembro da chinoca que eu visitava lá na querência, até que se casou com outro peão guapo).
Lacei minha prenda com meus bigodes fartos e minha voz grave, que a deixou tonta como o vento minuano.
Hoje penso nas 610 mil estrelinhas que brilham lá nos rincões do Cruzeiro do Sul devido à pandemia.