Nasceu de um descuido de uma ave que migrava rumo ao norte durante um inverno bravio e brotou como mais uma entre várias.
Cresceu no pasto e disputava o sol escasso entre a sombra de árvores centenárias. Um rio caudaloso mantinha o terreno fértil para acolher outras que chegaram depois.
Quando jovem, era vergada por crianças que se penduravam em seus galhos delicados, porém, à noite, o vento na direção contrária restaurava a posição original. Passando por frios enregelados e verões atordoantes, constituiu um tronco resistente e repleto de insetos em busca de abrigo, tatuagens coloridas (algumas amorosas, outras indecorosas) e ramos que equilibravam ninhos de passarinho.
A cada florada, o curso d’água se distanciava e o barulho crescia no entorno. Não era ventania, mas sim motores que se acercavam.
Já havia mais sol ao seu redor e a grama era menos selvagem. De vez em quando, um ruído pungente abria uma clareira e percebia, lá longe, o riacho.
O solo foi ficando mais seco, as cores rarearam e os pássaros se foram planando sobre a lagoa distante.
Um dia lhe cravaram uma plaquinha. Sua seiva chorou para cicatrizar a ferida informativa em duas línguas e que atraía a curiosidade de humanos em busca de raridade.
Agora vive cercada por uma tela de arame na frente de um laguinho longínquo escondido atrás de uma passarela. Passou a ser coadjuvante dos visitantes que se fotografam sob seu abrigo em busca de um ângulo favorável da obra civilizada, às custas da natureza perdida.
Hoje é (a) única.